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quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Profundamente - Manuel Bandeira

Quando ontem adormeci
Na noite de São João
Havia alegria e rumor
Vozes cantigas e risos
Ao pé das fogueiras acesas.
No meio da noite despertei
Não ouvi mais vozes nem risos
Apenas balões
Passavam errantes
Silenciosamente
Apenas de vez em quando
O ruído de um bonde
Cortava o silêncio
Como um túnel.
Onde estavam os que há pouco
Dançavam
Cantavam
E riam
Ao pé das fogueiras acesas?

— Estavam todos dormindo
Estavam todos deitados
Dormindo
Profundamente.

Quando eu tinha seis anos
Não pude ver o fim da festa de São João
Porque adormeci.

Hoje não ouço mais as vozes daquele tempo
Minha avó
Meu avô
Totônio Rodrigues
Tomásia
Rosa
Onde estão todos eles?
— Estão todos dormindo
Estão todos deitados
Dormindo
Profundamente.
Postado no blog da disciplina por Denilson Mendes.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Pela luz dos olhos teus - Vinicius de Moraes

Quando a luz dos olhos meus

E a luz dos olhos teus

Resolvem se encontrar

Ai, que bom que isso é meu Deus

Que frio que me dá o encontro desse olhar

Mas se a luz dos olhos teus

Resiste aos olhos meus

Só pra me provocar

Meu amor juro por Deus

Me sinto incendiar

Meu amor juro por Deus

Que a luz dos olhos meus

Já não pode esperar

Quero a luz dos olhos meus

Na luz dos olhos teus

Sem mais la ra ra ra...

Pela luz dos olhos teus

Eu acho meu amor que só se pode achar

Que a luz dos olhos meus precisa se casar

Quando a luz dos olhos meus

E a luz dos olhos teus

Resolvem se encontrar

Ai, que bom que isso é meu Deus

Que frio que me dá o encontro desse olhar

Mas se a luz dos olhos teus

Resiste aos olhos meus

Só pra me provocar

Meu amor juro por Deus

Me sinto incendiar

Meu amor juro por Deus

Que a luz dos olhos meus

Já não pode esperar

Quero a luz dos olhos meus

Na luz dos olhos teus

Sem mais la ra ra ra...

Pela luz dos olhos teus

Eu acho meu amor e só se pode achar

Que a luz dos olhos meus precisa se casar

Afixado no mural por Guilherme Garcia.

A Ciência - Fernando Pessoa

A CIÊNCIA, a ciência, a ciência...
Ah, como tudo é nulo e vão!
A pobreza da inteligência
Ante a riqueza da emoção!

Aquela mulher que trabalha
Como uma santa em sacrifício,
Com tanto esforço dado a ralha!
Contra o pensar, que é o meu vício!

A ciência! Como é pobre e nada!
Rico é o que alma dá e tem.
Afixado no mural.

Felicidade - Fernando Pessoa

Não se acostume com o que não o faz feliz, revolte-se quando julgar necessário.
Alague seu coração de esperanças, mas não deixe que ele se afogue nelas.
Se achar que precisa voltar, volte!
Se perceber que precisa seguir, siga!
Se estiver tudo errado, comece novamente.
Se estiver tudo certo, continue.
Se sentir saudades, mate-a.
Se perder um amor, não se perca!
Se o achar, segure-o!
Afixado no mural.

Brasil com "P" - Gog

Pesquisa publicada prova
Preferencialmente preto
Pobre prostituta pra polícia prender
Pare pense por quê?
Prossigo
Pelas periferias praticam perversidades parceiros
Pm's
Pelos palanques políticos prometem prometem
Pura palhaçada
Proveito próprio
Praias programas piscinas palmas
Pra periferia
Pânico pólvora pa pa pa
Primeira página
Preço pago
Pescoço peitos pulmões perfurados
Parece pouco
Pedro Paulo
Profissão pedreiro
Passatempo predileto, pandeiro
Pandeiro parceiro
Preso portando pó passou pelos piores pesadelos
Presídio porões problemas pessoais
Psicológicos perdeu parceiros passado presente
Pais parentes principais pertences
Pc
Político privilegiado preso
parecia piada
Pagou propina pro plantão policial
Passou pelo porta principal
Posso parecer psicopata
Pivô pra perseguição
Prevejo populares portando pistolas
Pronunciando palavrões
Promotores públicos pedindo prisões
Pecado!
Pena prisão perpétua
Palavras pronunciadas
Pelo poeta Periferia
Pelo presente pronunciamento pedimos punição para peixes pequenos poderosos
pesos pesados
Pedimos principalmente paixão pela pátria prostituída pelos portugueses
Prevenimos!
Posição parcial poderá provocar
protesto paralisações piquetes
pressão popular
Preocupados?
Promovemos passeatas pacificas
Palestra panfletamos
Passamos perseguições
Perigos por praças palcos
Protestávamos por que privatizaram portos pedágios
Proibido!
Policiais petulantes pressionavam
Pancadas pauladas pontapés
Pangarés pisoteando postulavam premios
Pura pilantragem !
Padres pastores promoveram procissões pedindo piedade paciência Pra população
Parábolas profecias prometiam pétalas paraíso
Predominou o predador
Paramos pensamos profundamente
Por que pobre pesa plástico papel papelão pelo pingado pela passagem pelo pão?
Por que proliferam pragas pelo pais?
Por que presidente por que?
Predominou o predador
Por que?
Afixado no mural.

Trem das Cores - Caetano Veloso

A franja na encosta
Cor de laranja
Capim rosa chá
O mel desses olhos luz
Mel de cor ímpar
O ouro ainda não bem verde da serra
A prata do trem
A lua e a estrela
Anel de turquesa
Os átomos todos dançam
Madruga
Reluz neblina
Crianças cor de romã
Entram no vagão
O oliva da nuvem chumbo
Ficando
Pra trás da manhã
E a seda azul do papel
Que envolve a maçã
As casas tão verde e rosa
Que vão passando ao nos ver passar
Os dois lados da janela
E aquela num tom de azul
Quase inexistente, azul que não há
Azul que é pura memória de algum lugar
Teu cabelo preto
Explícito objeto
Castanhos lábios
Ou pra ser exato
Lábios cor de açaí
E aqui, trem das cores
Sábios projetos:
Tocar na central
E o céu de um azul
Celeste celestial

Afixado no mural e postado no blog da disciplina por Diego Paulo.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

O Binômio de Newton - Álvaro de Campos (Fernando Pessoa)


O Binômio de Newton é tão belo como a Vênus de Milo.
O que há é pouca gente para dar por isso.
óóóó — óóóóóóóóó — óóóóóóóóóóóóóóó
(O vento lá fora.)

Vênus de Milo

Aqui o heterônimo de Fernando Pessoa traz em discussão a beleza contida nas diversas formas de expressão do homem. De um lado um teorema matemático, do outro uma estátua grega, a qual representa a deusa grega Afrodite. Álvaro de Campos propõe esta comparação, pois a beleza da matemática reside em poucos olhos, poucos serão capazes de olhá-la e ver beleza. Poderam muitos ver utilidade e estrutura lógica, a dificuldade se encontra em observarmos o belo.

Postado por Glauco Moreno.

Poema para Galileu - Antonio Gedeão


Estou olhando o teu retrato, meu velho pisano,
aquele teu retrato que toda a gente conhece,
em que a tua bela cabeça desabrocha e floresce
sobre um modesto cabeção de pano.
Aquele retrato da Galeria dos Ofícios da tua velha Florença.
(Não, não, Galileo! Eu não disse Santo Ofício.
Disse Galeria dos Ofícios.)
Aquele retrato da Galeria dos Ofícios da requintada Florença.
Lembras-te? A Ponte Vecchio, a Loggia, a Piazza della Signoria…
Eu sei… Eu sei…
As margens doces do Arno às horas pardas da melancolia.
Ai que saudade, Galileo Galilei!

Olha. Sabes? Lá em Florença
está guardado um dedo da tua mão direita num relicário.
Palavra de honra que está!
As voltas que o mundo dá!
Se calhar até há gente que pensa
que entraste no calendário.

Eu queria agradecer-te, Galileo,
a inteligência das coisas que me deste.
Eu,
e quantos milhões de homens como eu
a quem tu esclareceste,
ia jurar - que disparate, Galileo!
- e jurava a pés juntos e apostava a cabeca
sem a menor hesitação -
que os corpos caem tanto mais depressa
quanto mais pesados são.

Pois não é evidente, Galileo?
Quem acredita que um penedo caia
com a mesma rapidez que um botão de camisa ou que um seixo da praia?

Esta era a inteligência que Deus nos deu.

Estava agora a lembrar-me, Galileo,
daquela cena em que tu estavas sentado num escabelo
e tinhas à tua frente
um friso de homens doutos, hirtos, de toga e de capelo
a olharem-te severamente.
Estavam todos a ralhar contigo,
que parecia impossível que um homem da tua idade
e da tua condição,
se estivesse tornando num perigo
para a Humanidade
e para a Civilização.
Tu, embaraçado e comprometido, em silêncio mordiscavas os lábios,
e percorrias, cheio de piedade,
os rostos impenetráveis daquela fila de sábios.

Teus olhos habituados à observação dos satélites e das estrelas,
desceram lá das suas alturas
e poisaram, como aves aturdidas - parece que estou a vê-las -,
nas faces grávidas daquelas reverendíssimas criaturas.
E tu foste dizendo a tudo que sim, que sim senhor, que era tudo tal qual
conforme suas eminências desejavam,
e dirias que o Sol era quadrado e a Lua pentagonal
e que os astros bailavam e entoavam
à meia-noite louvores à harmonia universal.
E juraste que nunca mais repetirias
nem a ti mesmo, na própria intimidade do teu pensamento, livre e calma,
aquelas abomináveis heresias
que ensinavas e escrevias
para eterna perdição da tua alma.
Ai, Galileo!
Mal sabiam os teus doutos juízes, grandes senhores deste pequeno mundo,
que assim mesmo, empertigados nos seus cadeirões de braços,
andavam a correr e a rolar pelos espaços
à razão de trinta quilómetros por segundo.
Tu é que sabias, Galileo Galilei.
Por isso eram teus olhos misericordiosos,
por isso era teu coração cheio de piedade,
piedade pelos homens que não precisam de sofrer, homens ditosos
a quem Deus dispensou de buscar a verdade.
Por isso estoicamente, mansamente,
resististe a todas as torturas,
a todas as angústias, a todos os contratempos,
enquanto eles, do alto inacessível das suas alturas,
foram caindo,
caindo,
caindo,
caindo,
caindo sempre,
e sempre,
ininterruptamente,
na razão directa dos quadrados dos tempos.


Um pouco sobre Galileu...

Este poema discursa sobre uma época situada por volta de 1600, e sobre a vida de um dos "gigantes da física". Galileu que antes de 1611 lecionava matemática, ainda fazia suas explicações do sistema planetário com geocêntrico, mas já estava entrando em contato com as leituras de Copérnico. Em cartas a Kepler, a discussão sobre o sistema heliocêntrico séria ridículo, pois em contra posição as idéias aristotélicas e a simplicidade contidas nelas, bastavam para responder sobre muitas observações dos corpos celestes e outros fenômenos.

Porém em 1609, com a utilização do telescópio (Creditado a Hans Lippershey sua criação) Galileu pode fortificar a defesa da teoria heliocêntrica. Assim, por meio de várias observações Galileu descobriu refutações do que propunha os ideais aristotelicas-ptolomaico, das quais propunham os corpos celestes depois da Terra como, feitos por matéria “etérea” justificando a não queda para o centro do universo, o centro da Terra. Dentre essas refutações estão:


1º - A superfície da Lua;

Galileu percebeu que a Lua tinha em sua superfície crateras, as quais contradiziam a crença popular da época.

2º - A concepção da via-láctea;

Também, em suas observações Galileu conseguiu atentar para estrelas jamais vistas a olho nu. O que antes era apenas admiração aos olhos humanos, se tornou então um problema já que a maioria delas não era vistas por eles.

3º - Os satélites de Júpiter;

Ao apontar o telescópio para o "errante" Júpiter (os planetas eram chamados de errantes, pois em algumas épocas de suas órbitas realizavam movimentos retrógrados), Galileu percebeu os movimentos de 4 corpos celestes. Os quais realizavam esses movimentos ao redor de Júpiter e não ao redor da Terra como propunha o conhecimento da época.


Foi assim que Galileu, cujas idéias já estavam desfavoráveis ao geocentrismo publicou em 1610, o livro "Sidereus Nuncius" (tradução ao português: "O mensageiro das estrelas"). Neste livro estavam contidas as observações e relatos das refutações, a cima, descritas sucintamente.

Num primeiro momento tais argumentações foram, até, bem aceitas e seriam apresentadas na corte e ao futuro papa Urbano VIII. Porém, a igreja começou a tomar posicionamentos mais rígidos e interpretações ao pé da letra da Bíblia. E foi mais tarde, em 1616 que a Inquisição se mostrou contra a teoria heliocêntrica. Assim, muitos livros como os de Galileu, Copérnico, Giordano Bruno e outros foram parar na lista de livros proibidos. Então, que o embate começou a ganhar conseqüências.

Nesta época as pesquisas eram mais favoráveis a Tycho Brahe, pois como adepto fervoroso da teoria geocêntrica, realizava pesquisas e observações capazes de afirmar suas hipóteses.

Foi proibido então falar-se em teoria heliocêntrica como "Verdade Física", mas poderia ser estudada como hipótese matemática.

Nestes altos e baixos, um dos amigos de Galileu ascende a posição de Papa (Urbano VII) e dá a Galileu a oportunidade de mostrar suas hipóteses, porém de forma equilibrado. Colocando e contrapondo os dois pontos de vista, na criação de um livro. Foi assim, que podemos dizer de forma até ousada Galileu escreve "Dialogo di Galileo Galilei sopra i due Massimi Sistemi del Mondo Tolemaico e Copernicano"(Dialogo sobre os dois principais sistemas do mundo Ptolomaico e Copernicano). Diga-se de passagem, ousado, pois em seu livro as duas visões não eram colocadas tão equilibradas. Galileu de forma às vezes explicita, bem como implícita defende a concepção do sistema heliocêntrico.

Numa interpretação feita pelos "avaliadores" da igreja, o livro era uma oposição fortíssima as questões geocêntricas. Então, o papa Urbano VIII, incluiu também este livro ao "index" e utilizou-se das forças da inquisição para punir Galileu como forma de demonstrar a traição cometida.

A saída de que Galileu utilizou foi uma proposta controversa aos olhares de seus apoiadores, e a atitude correta aos olhares da igreja. Mas, talvez uma das mais inteligentes já pensadas. Pois, sob pressão de drásticas punições; um dos maiores defensores da teoria heliocêntrica começou a declarar que suas concepções eram errôneas e ditas de um "amador". Assim, ficou em "cárcere privado". Mas, ate então, "uma mordomia", diga-se de passagem. Pois, ficou num aposento do vaticano grande e no qual continuou a realizar seus estudos.

Foi então, em 1636,já com 74 anos e cego, que se concretizou a realização da sua ultima obra "Discorsi e Dimostrazioni Matematiche Intorno a Due Nuove Scienze"(conhecido pela tradução "Discursos e demonstrações matemáticas acerca de duas novas ciências" ou apenas "discursos"). Neste livro posto em diálogos, podemos dividi-lo em quatro partes ou jornadas. As duas primeiras falam sobre as "duas ciências" uma retomada aos diálogos e sobre a resistência dos materiais, respectivamente. As últimas duas partes propoem-se a avaliar e questionar o movimento acelerado e as leis dos movimentos de projeteis (Menção feita por Gedeão neste poema acima, nos últimos versos).

Pode-se dizer que não foi bem aceito e teve suas primeiras publicações na Holanda. Galileu, diga-se de passagem, foi um homem que realizou conquistas e propostas, já "muito velho". Contrapondo o que hoje se relata que para se descobrir algo deve ser uma pessoa nova, de cabeça limpa de influências. Eis um homem que contradiz este discurso popular.

Referências:

http://odiario.info/?p=103

http://galileu-galilei.webs.com/

http://pt.wikipedia.org/wiki/Galileu_Galilei

Postado por Glauco Moreno.

O poeta - Vinícus de Moraes

Olhos que recolhem

Só tristeza e adeus

Para que outros olhem

Com amor os seus.

Mão que só despejam

Silêncios e dúvidas

Para que outras sejam

Das suas, viúvas.

Lábios que desdenham

Coisas imortais

Para que outros tenham

Seu beijo demais.

Palavras que dizem

Sempre um juramento

Para que precisem

Dele, eternamente.

Postado no blog de Ciência e Cultura por Carlos Honorato.

Desejar ser - Manoel de Barros

Não é por gavar
mas eu não tenho esplendor.
Sou referente pra ferrugem
mais do que referente pra fulgor.
Trabalho arduamente para fazer o que é desnecessário.
O que presta não tem confirmação,
o que não presta, tem.
Não serei mais um pobre diabo que sofre de nobrezas.
Só as coisas rasteiras me celestam.
Eu tenho cacoete pra vadio.
As violetas me imensam.

Afixado no mural

O guardador de rebanhos - Fernando Pessoa

Tejo é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia,
Mas o Tejo não é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia
Porque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia,

O Tejo tem grandes navios
E navega nele ainda,
Para aqueles que vêem em tudo o que lá não está,
A memória das naus.

O Tejo desce de Espanha
E o Tejo entra no mar em Portugal.
Toda a gente sabe isso.
Mas poucos sabem qual é o rio da minha aldeia
E para onde ele vai
E donde ele vem.
E por isso, porque pertence a menos gente,
É mais livre e maior o rio da minha aldeia.

Pelo Tejo vai-se para o Mundo.
Para além do Tejo há a América
E a fortuna daqueles que a encontram.
Ninguém nunca pensou no que há para além
Do rio da minha aldeia.

O rio da minha aldeia não faz pensar em nada
Quem está ao pé dele está só ao pé dele.

Afixado no mural

Cortar o tempo - Carlos Drummond de Andrade

Quem teve a idéia de cortar o tempo em fatias,
a que se deu o nome de ano,
foi um indivíduo genial.

Industrializou a esperança, fazendo-a funcionar no limite da exaustão.

Doze meses dão para qualquer ser humano se cansar e entregar os pontos.
Aí entra o milagre da renovação e tudo começa outra vez, com outro número e outra vontade de acreditar que daqui pra diante vai ser diferente

Afixado no mural por Juscelino Moura

Máquina Breve - Cecília Meireles

O pequeno vaga-lume
com sua verde lanterna,
que passava pela sombra
inquietando a flor e a treva
- meteoro da noite, humilde,
dos horizontes da relva;
o pequeno vaga-lume,
queimada a sua lanterna,
jaz carbonizado e triste
e qualquer brisa o carrega:
mortalha de exíguas franjas
que foi seu corpo de festa.

Parecia uma esmeralda
e é um ponto negro na pedra.
Foi luz alada, pequena
estrela em rápida seta.
Quebrou-se a máquina breve
na precipitada queda.
E o maior sábio do mundo
sabe que não a conserta.

Afixado no mural

Pergunta e Resposta - Ferreira Gullar

Se é fato que
toda a massa do sistema
solar (somando a de Saturno e Marte
e Terra e Vênus e Urano e Mercúrio
e Plutão, mais
os satélites, mais
os asteróides, mais) equivale
apenas a 2% da massa
total do Sol e
que o Sol não é mais
que um mínimo ponto
de luz na estonteante tessitura de
gás e poeira da Via
Láctea e que a ViaLáctea é apenas uma
entre bilhões de galáxias
que à velocidade de 300 mil km por segundo
voam e explodem
na noite então pergunto:
o que faz aí
meu poema com seu
inaudível ruído?

E respondo:
Inaudível
para quem esteja
na galáxia NGC 5128
ou na constelação
de Virgo ou mesmo
em Ganimedes
onde felizmente não estás,
Cláudia Ahimsa,
poeta e musa do planeta Terra.

Afixado no mural por Lídia Santana

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Poesia na sala de aula de ciências?

Segue abaixo uma pequena parte do artigo de Ildeu de Castro Moreira que foi sugerido pelo Gilmar. Segue também o link de acesso.

Poesia na sala de aula de ciências? A literatura poética e possíveis usos didáticos.

"Existem relações profundas entre Ciência, cultura e arte no processo de criação humana. No entanto, a discussão integrada dessas dimensões raramente se realiza nas salas de aula. Numa tentativa de motivar a discussão de alguns temas científicos importantes e atuais, em particular dentro da Física, mas não exclusivamente, propomos a exploração, em sala, de poemas referentes à Ciência existentes na Literatura brasileira e portuguesa, de forma interligada e em interação com outras disciplinas (Português e História, por exemplo).
Dentro do objetivo didático exposto, poemas foram aqui reunidos segundo um tema “científico” geral. A idéia é que sejam discutidos de maneira interdisciplinar, de preferência acompanhados de um apanhado histórico das relações entre Ciência e poesia relativas àquele tema, do contexto científico e literário associado e de análises sobre o conteúdo e forma dos poemas."
Para ler o artigo completo clique aqui.

Moraliza o poeta nos ocidentes do Sol a inconstância dos bens do mundo - Gregório de Matos

Nasce o Sol, e não dura mais que um dia,
Depois da Luz se segue a noite escura,
Em tristes sombras morre a formosura,
Em contínuas tristezas a alegria.

Porém se acaba o Sol, por que nascia?
Se formosa a Luz é, por que não dura?
Como a beleza assim se transfigura?
Como o gosto da pena assim se fia?

Mas no Sol, e na Luz, falte a firmeza,
Na formosura não se dê constância,
E na alegria sinta-se tristeza.

Começa o mundo enfim pela ignorância,
E tem qualquer dos bens por natureza
A firmeza somente na inconstância.
Afixado no mural

Quanta - Gilberto Gil

Quanta do latim
Plural de quantum

Quando quase não há
Quantidade que se medir
Qualidade que se expressar
Fragmento infinitésimo
Quase que apenas mental
Quantum granulado no mel
Quantum ondulado no sal
Mel de urânio, sal de rádio
Qualquer coisa quase ideal

Cântico dos cânticos
Quântico dos quânticos

Canto de louvor
De amor ao vento
Vento arte do ar
Balançando o corpo da flor
Levando o veleiro pro mar
Vento de calor

De pensamento em chamas
Inspiração
Arte de criar o saber
Arte, descoberta, invenção
Teoria em grego quer dizer
O ser em contemplação

Cântico dos cânticos
Quântico dos quânticos

Sei que a arte é irmã da ciência
Ambas filhas de um Deus fugaz
Que faz num momento
E no mesmo momento desfaz
Esse vago Deus por trás do mundo
Por detrás do detrás

Cântico dos cânticos
Quântico dos quânticos

Afixado no mural por - Gilmar Neves

Meus oito anos - Casimiro de Abreu

Oh ! que saudades que eu tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais !
Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais !

Como são belos os dias
Do despontar da existência !
- Respira a alma inocência
Como perfumes a flor;
O mar é – lago sereno,
O céu – um manto azulado,
O mundo – um sonho dourado,
A vida – um hino d’amor !

Que auroras, que sol, que vida,
Que noites de melodia
Naquela doce alegria,
Naquele ingênuo folgar !
O céu bordado d’estrelas,
A terra de aromas cheia,
As ondas beijando a areia
E a lua beijando o mar !

Oh ! dias de minha infância !
Oh ! meu céu de primavera !
Que doce a vida não era
Nessa risonha manhã !
Em vez de mágoas de agora,
Eu tinha nessas delícias
De minha mãe as carícias
E beijos de minha irmã !

Livre filho das montanhas,
Eu ia bem satisfeito,
De camisa aberta ao peito,
- Pés descalços, braços nus -
Correndo pelas campinas
À roda das cachoeiras,
Atrás das asas ligeiras
Das borboletas azuis !

Naqueles tempos ditosos
Ia colher as pitangas,
Trepava a tirar as mangas,
Brincava à beira do mar;
Rezava às Ave-Marias,
Achava o céu sempre lindo,
Adormecia sorrindo,
E despertava a cantar !

Oh ! que saudades que eu tenho
Da aurora da minha vida
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais !
- Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais !

Afixado no mural por - Glauco Gomes

Ode Mortal (excerto) - Álvaro de Campos (Fernando Pessoa)


Tu, Caeiro meu mestre, qualquer que seja o corpo


Com que vestes agora, distante ou próximo, a essência

Da tua alma universal localizada,

Do teu corpo divino intelectual...

Viste com a tua cegueira perfeita, sabes o não ver...

Porque o que viste com os teus dedos materiais e admiráveis

Foi a face sensível e não a face fisiognomónica das coisas

Foi a realidade, e não o real.

É à luz que ela é visível,

E ela só é visível porque há luz,

Porque a verdade que é tudo é só a verdade que há em tudo

E a verdade que há em tudo é a verdade que o excede!

Ah, sem receio!

Ah, sem angústia!

Ah, sem cansaço antecipado da marcha

Nem cadáver velado pelo próprio cadáver na alma

Nas noites em que o vento assobia no mundo deserto

E a casa onde durmo é um túmulo de tudo,

Nem o sentir-se muito importante sentindo-se cadáver,

Nem a consciência de não ter consciência dentro de tábuas e chumbo,

Nem nada...

Olho o céu do dia, espelha o céu da noite

E este universo esférico e côncavo

Vejo-o como um espelho dentro do qual vivemos,

Limitado porque é a parte de dentro

Mas com estrelas e o sol rasgando o visível

Por fora, para o convexo que é infinito...

E aí, no Verdadeiro,

Tirarei os astros e a vida da algibeira como um presente ao Certo,

Lerei a Vida de novo, como numa carta guardada

E então, com luz melhor, perceberei a letra e saberei.

O cais está cheio de gente a ver-me partir.

Mas o cais é à minha volta e eu encho o navio —

E o navio é cama, caixão, sepultura — E eu não sei o que sou pois já não estou ali...

E eu, que cantei

A civilização moderna, aliás igual à antiga,

As coisas do meu tempo só porque esse tempo foi meu,

As máquinas, os motores,

(...)

Vou em diagonal a tudo para cima.

Passo pelos interstícios de tudo,

E como um pó sem ser rompo o invólucro

E partirei, globe-trottrer do Divino,

Quantas vezes, quem sabe?, regressando ao mesmo ponto

(Quem anda de noite que sabe do andar e da noite?),

Levarei na sacola o conjunto do visto —

O céu e de estrelas, e o sol em todos os modos,

E todas as estações e as suas maneiras de cores,

E os campos, e as serras, e as terras que cessam em praias

E o mar para além, e o para além do mar que há além.

E de repente se abrirá a Última Porta das coisas,

E Deus, como um Homem, me aparecerá por fim.

E será o Inesperado que eu esperava —

O Desconhecido que eu conheci sempre —

O único que eu sempre conheci,

E (...)

Gritai de alegria, gritai comigo, gritai,

Coisas cheias, sobre-cheias,

Que sois minha vida turbilhonante...

Eu vou sair da esfera oca

Não por uma estrela, mas pela luz de um estrela —

Vou para o espaço real...

Que o espaço cá dentro é espaço por estar fechado

E só parece infinito por estar fechado muito longe —

Muito longe em pensá-lo.

A minha mão está já no puxador-luz.

Vou abrir com um gesto largo,

Com um gesto autêntico e mágico

A porta para o Convexo,

A janela para o Informe,

A razão para o maravilhoso definitivo.

Vou poder circum-navegar por fora este dentro

Que tem as estrelas no fim, vou ter o céu

Por baixo do sobrado curvo —

Tecto da cave das coisas reais,

Da abóbada nocturna da morte e da vida...

Vou partir para FORA,

Para o Arredor Infinito,

Para a circunferência exterior, metafísica,

Para a luz por fora da noite,

Para a Vida-morte por fora da morte-Vida.


Afixado no mural por - Rafaela